Ozempic passa a ser vendido somente com receita; médicos alertam para uso abusivo no Brasil
Fonte: G1 Foto: Reprodução Adobe Stock
A venda de medicamentos agonistas GLP-1, como Ozempic, Wegovy, Saxenda e similares, usados para o emagrecimento, passou a ter um controle mais rigoroso, após decisão da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Especialistas ouvidos pelo g1 destacam um aumento preocupante
no uso desses remédios fora das indicações clínicas recomendadas, o que pode
ser considerado um uso abusivo e sem acompanhamento médico.
Além disso, o uso inadequado pode
levar a um aumento na demanda por esses medicamentos, resultando em escassez
para aqueles que realmente precisam, como os pacientes com diabetes tipo 2.
A
Anvisa decidiu que será obrigatória a retenção de receita médica para
venda desses medicamentos. Atualmente, esta categoria classificada com a tarja
vermelha só deveria ser comercializada com a apresentação da receita. Na
prática, é comum que ela não seja exigida e, por isso, clientes sem o documento
conseguem comprar os medicamentos.
A decisão passará a ter valor 60
dias após a publicação no Diário Oficial da União (DOU), como uma
alteração na Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) 471/2021, que dispõe, entre
outras coisas, sobre a prescrição e controle de medicamentos.
A votação ocorreu após análise de
farmacovigilância, que se baseou em dados de notificação no VigiMed. O sistema
da Anvisa gere dados de efeitos secundários de medicamentos e compartilha com
outros países. Numa análise comparativa, foram identificados muito mais eventos
adversos relacionados ao uso fora das indicações aprovadas pela Anvisa no
Brasil do que no exterior.
Em seus votos, os diretores da
agência destacaram que existe a necessidade de proteger a população do uso
abusivo desses medicamentos. Conhecidos popularmente como "canetas
emagrecedoras", eles foram desenvolvidos para diabetes, mas acabaram sendo
também indicados para a obesidade.
A decisão foi tomada pela Anvisa
depois da divulgação de uma carta pelo Conselho Federal de Medicina. Nela, os
médicos defendiam a necessidade de um maior controle na venda desse tipo de
medicamento.
A pesquisadora da USP Thamires
Capello apresentou a Anvisa um estudo sobre o perfil dos consumidores das
canetas emagrecedores. A pesquisa mostrou que 45% das pessoas fizeram a compra
sem prescrição médica. Dessas, 73% nunca tiveram orientação de um profissional
de saúde. Além disso, mais da metade usaram apenas para emagrecimento.
Um levantamento do Fantástico
exibido no dia no dia 13 de abril mostrou que só nesse ano houve mais de 350
apreensões de medicamentos falsos e contrabandeados em aeroportos de todo o
país.
Em apenas duas apreensões na
semana passada, a Receita Federal confiscou mais de 600 canetas no Aeroporto
Internacional do Recife.
Médicos alertam sobre o uso
indiscriminado das canecas emagrecedoras
O uso indiscriminado (de Ozempic
e seus similares), principalmente por pessoas que buscam perder peso
rapidamente sem a orientação adequada de um profissional de saúde, levanta
questões éticas e de segurança.
Por outro lado, médicos
reconhecem que esses medicamentos, quando utilizados corretamente, podem trazer
benefícios significativos para o controle do peso e da glicemia, melhorando a
saúde metabólica dos pacientes.
O uso abusivo dos medicamentos
para obesidade pode levar a desnutrição grave, perda de massa muscular, queda
de cabelo intensa e problemas relacionados a falta de vitaminas, destaca a
médica endocrinologista e diretora do departamento de Endocrinologia do Esporte
e Exercício da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM),
Cristina Schreiber.
“Com o acompanhamento médico, a
falta de apetite é monitorada, assim como o padrão alimentar, evitando que o
paciente pare de se alimentar corretamente, por exemplo. Além disso, os platôs
na perda de peso são acompanhados de forma a evitar frustrações, criando novas
estratégias durante o tratamento”, acrescenta Schreiber.
O médico nutrólogo Noé Alvarenga
acrescenta que o usuário comum não percebe que, como acontece com qualquer
medicamento, o uso indiscriminado leva à perda progressiva de eficácia,
exigindo doses cada vez maiores para reproduzir o efeito inicial.
“Sem o suporte contínuo de médico
e nutricionista, a massa magra se perde de forma irreversível e, após a
suspensão da medicação, esse desgaste atua como poderoso gatilho para o rápido
reganho de peso”, explica Alvarenga.
Dados recentes indicam que a
prática de prescrever esses medicamentos para finalidade, com dosagem ou para
faixa etária que não está aprovada pela Anvisa no Brasil (uso off-label)
cresceu substancialmente, acrescenta a médica endocrinologista e nutróloga do
Grupo Valsa e Membro da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da
Síndrome Metabólica (Abeso) Samara Rodrigues.
“Uma pesquisa (realizada pela
empresa de análise de mercado IQVIA) revelou que, em 2022, o número de
prescrições de medicamentos para perda de peso aumentou 41% em comparação com o
ano anterior. Isso é preocupante, pois muitos pacientes podem não estar cientes
dos possíveis efeitos colaterais, como problemas gastrointestinais, risco
aumentado de pancreatite e até mesmo problemas de tireoide”, declara Rodrigues.
Um estudo publicado na revista
Diabetes Care mostrou que, em 2021, aproximadamente 30% das prescrições de
Ozempic (no mundo) eram feitas para pacientes sem diabetes, o que é um sinal
claro de que há uma necessidade de educação e de regulamentação da necessidade
de receita para compra.
Especialistas defendem que os
profissionais de saúde realizem um trabalho de conscientização junto a
pacientes e à sociedade em geral sobre a importância do uso responsável e
orientado desses medicamentos.
“A obesidade é uma doença
crônica, geneticamente herdada. Assim, durante o acompanhamento médico
importantes decisões como aumentar, reduzir a dose são tomadas a fim de que o
tratamento se torne eficaz e sustentável ao longo do tempo”, destaca Schreiber.
“A promoção de hábitos saudáveis,
como uma alimentação equilibrada e a prática regular de atividade física, deve
ser sempre a primeira linha de abordagem para a perda de peso e o controle
metabólico”, complementa Rodrigues.
Em nota ao g1, a Novo
Nordisk disse que "compartilha das mesmas preocupações da Anvisa quanto ao
uso irregular de medicamentos".



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